sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

As grande lições do caçador de pipas



Recentemente, relendo meus alfarrábios mentais, me veio à mente uma das histórias mais tocantes que já li/assisti. Por que pensei, tão repentinamente, em O Caçador de Pipas? Talvez por estar martelando em mim, tem alguns dias, a diferença tênue que existe entre as ideias de "fidelidade" e "lealdade", na amizade e nas relações em geral.

Antes de mais nada, cabe falar um pouco do livro do afegão-americano Khaled Housseini. É a história da relação de amizade entre o garoto rico Amir, e Hassan, seu melhor amigo, filho do criado de seu pai. Ao longo dos doze anos que se passaram em sua vida, até que a história começa, Amir e Hassan foram amigos. Cresceram juntos. O pai de Amir, o rico Baba, é, também, amigo de infância do pai de Hassan, Ali, e tem por ele e pelo filho uma consideração familiar, apesar de Ali ser um criado em sua casa.

Amir é campeão das diversas competições de empinadores de pipas que ocorrem no Afeganistão, e Hassan, seu fiel escudeiro, é o "caçador de pipas", que as encontra e as exibe como um troféu de seu amigo. Numa dessas competições, vencidas por Amir, Hassan, ao caçar sua pipa em um lugar ermo, é encontrado e violentado por Assef, um adolescente encrenqueiro, e seus aceclas. O ato é presenciado, de longe, por Amir, que não tem coragem de intervir, e cuja culpa por não ter defendido seu amigo, ou pelo menos tentado, o envenena, a ponto de forjar uma situação para que Hassan seja afastado de sua casa, e ele não tenha de conviver todos os dias com aquela lembrança. Para incriminá-lo, esconde um relógio de pulso valioso debaixo de seu colchão, dando à impressão de que ele pretendia cometer um roubo. Ao ser descoberto, Hassan opta por admitir o crime, em vez de acusar Amin, que ele, intimamente, sabia ser o culpado por aquilo.

Os anos se passam, e Amir cresce. Cresceu sentindo culpa pelo que fez na infância, com aquele que era seu melhor amigo. Vivendo nos EUA, recebe uma ligação para retornar ao Afeganistão, onde descobre que Hassan foi morto pela milícia talibã, e seu filho era prisioneiro e escravo sexual de um miliciano. Descobre, também, que Hassan era, na verdade, seu meio-irmão, filho da relação entre seu pai e a esposa de Ali. O remorso lhe toma conta, e ele tenta compensá-lo tirando o jovem Sohrab, filho de Hassan, da vida que levava, e adotando-o.

A história, com final emocionante, pode ser tomada de diversas formas, inclusive como uma metáfora entre a relação entre os EUA e o Afeganistão, sendo o primeiro personificado na figura de Amir, aquele que vê o amigo ser violentado, e prefere assistir a tudo ao invés de intervir. Eu, em minha visão mais voltada para os sentimentos envolvidos, prefiro ver a história resumida em uma única frase, que Hassan diz a Amir, e que marca todas as provas de amizade que ele lhe dá ao longo da história: "Por você, eu faria isso mil vezes".

"Por você, eu faria isso mil vezes" é o meu pretexto para pensar na fidelidade e na lealdade como formas de se conceber a relação entre as pessoas. Ser fiel é fechar os olhos e estar ao lado de alguém ou de algo, cegamente, indo, às vezes, contra os próprios sentimentos e valores. Ser leal a alguém é, antes de tudo, ser leal a si mesmo, aos próprios sentimentos, e à clareza na relação com o outro.

Para muitos, pensando assim, Hassan pode ser visto como aquele que tem fidelidade canina ao amigo Amir, não o deixando nem nos momentos em que ele mais o decepciona. Para mim, no entanto, a lealdade é a ideia que traduz o sentimento de Hassan por Amir. Ali, ele era leal ao profundo amor fraterno que sentia pelo amigo/irmão com quem crescera e compartilhara tantas coisas.

É difícil pensar, pra mim, nas relações de amizade sem lembrar no Hassan criado por Khaled Hosseini. "Por você, eu faria isso mil vezes". Que todos os sentimentos de companheirismo e cumplicidade entre as pessoas sejam resumidos na extrema lealdade, e traduzidos na frase que expressa a entrega e o braço sempre disposto a erguer o outro, assim como o fez o jovem "caçador de pipas".

Bom fim de ano!

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Fim de ano é isso aí

Não sei o porquê, mas essas festas de fim de ano me deixam assim... sabe? Mais melancólico, mais sensível, mais dado a emoções. Você pode tar dizendo: mas é assim com todo mundo! E eu diria que, em geral, as pessoas ficam mais sensíveis. Mas também é normal eu achar que meu sentimento é único. Porque é, ninguém sente igual a mim, nem eu igual a ninguém. Minha melancolia tem impressão digital própria. É estranho esse momento de renovação. Um misto de alegria pelo que virá, e saudade do que passou. Eu ainda tô muito na fase da saudade.

Quem me conhece, sabe que esse tipo de sentimento não me é incomum. Tenho melancolia de aniversário, de fim de ano, de dias sem datas especiais. Vai ver sou mesmo um melancólico crônico. É que as coisas acontecem, e minha reação é introspectiva. Eu tendo a agir pra dentro. A socar não meu fígado, mas minha alma. E a massagear também, que esse sentimento é, acima de tudo, contraditório.

Bom, pros que chegaram até esse parágrafo, quero dizer que o fim de ano chegou e traz comigo, nessa melancolia, um grande desejo de que esse ano fosse eterno. 2011 foi muito bacana. Um ano de transformações grandes. Um ano em que eu tô começando a conviver comigo mesmo de maneira melhor, e, principalmente, a conversar mais comigo mesmo, de maneira mais competente. Com minhas pequenas idiossincrasias. Tudo isso, aliado a um turbilhão de outras coisas, me fizeram crescer. E pode ser que eu tenha me tornado alguém um pouquinho melhor nos últimos 365 dias.

Aos amigos, que esse Natal atraia esse sentimento intimista, que é gostoso também. Faz a gente valorizar aquilo que a gente tem, não o que a gente perdeu. Pros inimigos, não digo nada. Creio que não os tenho. Pros grandes amigos, os melhores amigos, também não digo nada, agora. Toda hora é hora de dizer o que é preciso, e nesse não foi diferente. Mas, antes de tudo, sei que nos subentendemos, e é isso que importa: nosso silêncio grandiloquente e confortante.

Um abraço.

sábado, 3 de dezembro de 2011

Vai vivendo (ou sobre a ideia de felicidade)

Renato aprendeu desde cedo a não andar descalço, a usar a camisa combinando com a calça, e a escrever gramática e ortograficamente correto. Mas ninguém o ensinou a lidar com as pessoas. Parecia difícil entender que haviam cláusulas de convivência que regulavam a vida de todo mundo, inclusive a dele. Que o mundo não se resumia à sua aldeia, ou melhor, ao seu quarto, seus brinquedos, sua vidinha tranquila.

Renato morria de medo da companhia dos outros. As pessoas lhe causavam ansiedade, e ele sempre via aqueles que, porventura, aparecessem em sua casa, esporadicamente, ou pra passar uma temporada, como um estorvo - alguém que mexia com sua rotina. Seu mundo individualista e pequeno-burguês coincidia com sua vida de filho único de uma família de classe média-média.

Amigos vinham para brincar, nas férias ou no fim de semana, e passavam, no máximo, uma manhã ou uma tarde. Mais do que isso era mexer demais com sua rotina, sua vida regrada, os programas de TV que gostava de assistir.

Renato estava longe de ser um mimado chato, pidão, intragável. No máximo, era um menino anti-social, mas não externava nenhum defeito grave maior que isso. Era calado, quieto, aparentava inteligente, tirava boas notas no colégio. Tinha uma convivência amistosa com os colegas, professores, com os pais, tios, primos, avós, etc. Só não estreitava relações. Não tinha um "melhor amigo". No máximo, tinha colegas - essa era a relação mais próxima da amizade que ele praticava.

O maior medo de Renato era deixar de ser filho único. Não que ele não quisesse dividir seus pais, alguma coisa qualquer que sua família fosse lhe deixar... mas é que um irmão mudaria sua vida de forma tão definitiva que a ideia lhe causava pânico. E assim foi durante toda sua infância, embora o pai entendesse que sua solidão era anormal demais para os meninos de sua idade. Que seu egocentrismo, embora não o tornasse antipático perante as pessoas com quem convivia, fazia dele alguém que poderia ter problemas de relacionamento muito graves no futuro.

O caso é que Renato cresceu. Era um garoto de bom-senso, um menino educado, e a adolescência chegou, causando algumas transformações em seu modo de enxergar a si e ao mundo. Causa em todo mundo, mas nele foi um pouco mais além do interesse pelas meninas e das mudanças no corpo. Não, não deu exatamente trabalho aos pais. Jamais fugiu de casa, nunca experimentou álcool ou drogas. Jamais bateu boca com o pai ou a mãe. Hoje, olhando pra trás, os pais dizem que Renato foi um adolescente que não deu trabalho. De repente, foi a fase mais tranquila de sua vida (embora ele sempre tenha sido um menino tranquilo).

No seu íntimo, Renato vivia uma crise. A solidão que jamais o incomodara na infância se tornava um fardo na adolescência. Para ele, relacionar-se era difícil. De repente, passava-lhe a fazer falta o irmão que não teve. Não queria uma criança por perto - essa não era exatamente a ideia. Mas sentia falta de dividir com as pessoas as sensações novas, de conversar bobagem. No fundo, Renato cresceu sem se sentir à vontade perto de ninguém.

Pareceu a todos uma passagem serena a de Renato pela vida, da infância à jovem maturidade. Passou no vestibular bem classificado. Foi um bom aluno, talvez um dos melhores. Formou-se com louvor. Entrou na pós-graduação, arranjou um bom emprego... Mas a vida social de Renato andava a passos lentos. Só no fim da adolescência, e início da vida adulta, começou a fazer amizades mais sólidas. Só nessa época começou a tomar coragem para se aproximar das mulheres. Não que ele não sentia necessidades físicas, como todos os homens, mas era um tímido crônico.

A vida transformou Renato num adulto bem-sucedido, e relativamente feliz. As coisas com ele sempre aconteceram com uma velocidade mais reduzida que a maioria. Ele ainda precisa resolver alguns conflitos psicológicos, ainda precisa trabalhar certas carências, ainda precisa aprender certas coisas sobre a vida prática. Mas ele tem pessoas legais ao seu lado. No fundo, a forma como conduziu a vida trouxe-lhe a vantagem de ser um grande observador das pessoas, a aguçar sua sensibilidade, a escolher bem os amigos, a namorada, enfim. Vai vivendo.

Às vezes, a felicidade é efêmera. Para Renato foi, e continua sendo. Pra muita gente, ele pode parecer alguém infeliz, que queimou etapas da vida. Pra outros, um cara muito bacana, de coração enorme, mas meio melancólico, às vezes. Para ele... bom, ele não sabe muito bem. Talvez nunca saiba. Mas ele olha em volta, e aprendeu a valorizar coisas bem pequenas, que guarda só pra si, em um lugar reservado de sua alma. Aprendeu a externar felicidades simples, sóbrias. Renato é meio filósofo para os amigos, para a família, para muita gente que tem um carinho enorme por ele e, sem saber expressar muito bem em palavras, o entende, e gosta dele porque é assim.

E vai vivendo!

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Melancolia pré-férias (ou Sobre minha relaçãao inconstante com o mundo)

É, né? Tá chegando. Putz, eu preferia que demorasse bem mais, mas chegou. Férias de dezembro, férias do primeiro ano do Mestrado, e eu mais DOWN do que em todas as outras. Deve ser o tempo que passa. Tô ficando velho, cada dia mais melancólico, e mais chato.

Tenho pouco a dizer, mas queria só compartilhar meu silêncio com vocês. Com quem quiser, com quem se dispuser. Aí vai meu silêncio:

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Tem gente que anda desafinando
Do coro dos contentes
Eu prefiro ser contente
De um contentamento descontente
Tão contente que ausente
Tão ausente quanto crente
(Nunca descrente)
Nunca impotente
De uma melancolia sempre recorrente
De tão corrente
Eu queria ser diferente,
Gente

Às vezes embarcar num disco
Pra permanecer sempre no asterisco
Preferia ficar sempre perto do obelisco
Onde corro o risco
De virar eu mesmo o obelisco

Petrificado, ratificado
Virar um obelisco melancólico
E chato

Às vezes quero pedir colo, mas sou péssimo com as palavras
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Valeu, gente.