domingo, 5 de maio de 2013

Sangue Bom: o bálsamo das 7




De alguns anos pra cá, minha relação com as telenovelas já se transformou algumas vezes. Num passado nem tão distante (até porque a idade não permite, rs), eu assistia novela unicamente pra me divertir, pra curtir a história. Depois, quando se tornou mais forte uma certa vocação para a escrita, passei a ver novelas com um olhar mais crítico, mais técnico, chegando até mesmo a criticar novelas no ar por serem por demais folhetinescas (folhetim que é, afinal, a marca da telenovela desde sempre, ora bolas...). Hoje, o pouco conhecimento mais técnico que adquiri, e um pouquinho mais de maturidade, me fizeram voltar a ver as novelas pra me divertir. Meu conceito de “novela boa”, desde então, não é a mais bem elaborada, a mais tecnicamente perfeita, mas é a que me conquista, e ponto.

E olha: isso não me tornou menos exigente. De uns tempos pra cá, poucas novelas têm ganho meu coração de chofre. A última, sem sombra de dúvidas, foi a divertida e coloridíssima Cheias de Charme, que superou em meu coração até mesmo o blockbustter Avenida Brasil. Antes dela, A Vida da Gente, e, numa escala regressiva, Ti Ti Ti. E é aí que tomo impulso para chegar no tema desse post, que vem pra tirar o SuperCult de seu sono profundo de alguns meses: a sensacional retomada da equipe de roteiristas desse sucesso de 2010 no trabalho que estreou na TV na última segunda-feira (28): Sangue Bom.

Não é segredo que sou um grande admirador do trabalho de Maria Adelaide Amaral e de sua equipe. O prodigioso talento de Vincent Villari, associado ao tom de roteiristas como Letícia Mey, Marta Nehring, Rodrigo Amaral e Tati Bernardi faz dos textos dessa turma, especialmente os voltados para as 19h, um misto de humor e sofisticação. Mesmo as cenas mais bufônicas possuem uma piada inteligente, uma tirada intelectual, que, embora muitas vezes não entendida pelo público médio, não diminui o gosto deste pelo que vê – e é aí que está a genialidade da coisa.

Bem, falemos de Sangue Bom. A novela começa com o pé direito ao trazer duas coisas: frescor juvenil e um tema universal. Quando falo em frescor juvenil não falo de ares de Malhação (apesar do fato de vários de seus protagonistas já terem passado pelo folheteen global). Falo de protagonistas jovens, na faixa dos vinte e poucos anos, o que quebra um pouco com uma tendência dos nossos tempos de terem heróis balzaquianos. A corrente amorosa formada por Marco Pigossi, Sophie Charlotte, Jayme Matarazzo, Fernanda Vasconcelos, Humberto Carrão e Isabelle Drummond compõe um cenário com muito do que há de melhor em termo de elenco nessa faixa etária. Os atores estão muito bem colocados em seus personagens. Pigossi dá vida a um Bento que é bom, honesto, confiante na vida – mas que não é bobo. Sophie consegue transparecer em cada cena a crise de identidade que envolve sua fútil Amora, e que é, afinal, a espinha dorsal da trama. Isabelle é, até esse momento, a melhor em cena, com sua Giane, uma coprotagonista justissimamente entregue a ela, que merece papeis daí pra cima desde sua adorável Cida em Cheias de Charme.

Quanto à temática, a trama tem uma marca muito própria da dupla Adelaide e Vincent desde Ti Ti Ti: trabalhar o “politicamente correto” sem hipocrisia, retirando o seu teor chato e deixando o que ele tem de melhor. Sangue Bom é, por excelência, uma parábola sobre valores. Valores que, mesmo em uma sociedade pós-moderna, em constante transformação, continuam mostrando um conflito humano bastante antigo: a tensão entre o “ter” e o “ser”. Amora, a protagonista, é linda, rica, badalada. Ela tem. Bento, o herói, é pobre, honesto e digno. Ele é. Mas essa relação, aparentemente de preto no branco, vai se transformar ao longo da trama, e torná-la uma bela discussão sobre o humano e sua complexidade.

Para além dos protagonistas, a trama retoma alguns excelentes medalhões de nossa dramaturgia, em papeis nos quais também estão muito bem colocados. Giulia Gamm está muito bem na pele da histriônica Bárbara Ellen, elogio que se potencializa (tanto quanto nas escalas de tom) quando se trata de Marisa Orth e sua Damaris. Malu Mader caiu muito bem em uma mulher simples, uma típica paulistana do subúrbio, que faz o possível e o impossível pra realizar o sonho do filho. Letícia Sabatella reina com sua classuda Verônica, uma mulher que é traída pelo marido.

Em suma, Sangue Bom vem como um bálsamo das 7. Depois de uma Guerra dos Sexos, que foi sem não ter sido, chega uma novela com nome e sobrenome. Uma temática recorrente, uma pegada agradável e um ótimo elenco, que dará prazer de se ver. Vamos embarcar?

Um comentário:

  1. Felizmente, concordo com você no que tange ao lado cômico da novela. Ela consegue trazer um humor inteligente e elegante - tentativa frustrada de Sílvio de Abreu na antecessora - e não apela para os bordões e piadas escrachadas - usadas em Cheias de Charme e que deram certo. Ou seja, uma nova linguagem dos autores para o horário - já vistos antes em Ti Ti Ti.

    Quanto aos outros pontos, não consigo considerar Sangue Bom a tal "última bolacha do pacote", como muitos andam dizendo. Em alguns momentos a sensação que dá é que tenta prender o público pela beleza dos atores, dos cenários, pelas músicas, cores, enfim, qualquer coisa além de uma grande história. Acredito mesmo que antes dela ser tão boa como andam dizendo, ela tem pontos bons, mas está longe de ser uma grande novela das sete...

    Enfim, seu blog é muito bom! Parabéns!

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